Fausto - Goethe

É certamente uma das obras mais influentes da literatura mundial. Seu protagonista foi considerado a representação paradigmática do sujeito moderno.

Fausto, água-forte de Rembrandt.Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.

Fausto é o protagonista de uma popular lenda alemã de um pacto com o demônio, baseada no médico, mágico e alquimista alemão Dr. Johannes Georg Faust (1480-1540). O nome Fausto tem sido usado como base de diversos romances de ficção, o mais famoso deles do autor Goethe, produzido em duas partes, tendo sido escrito e reescrito ao longo de quase sessenta anos. A primeira parte - mais famosa - foi publicada em 1806 e a segunda, em 1832 - às vésperas da morte do autor.
Considerado símbolo cultural da modernidade, Fausto é um poema de proporções épicas que relata a tragédia do Dr. Fausto, homem das ciências que, desiludido com o conhecimento de seu tempo, faz um pacto com o demônio Mefistófeles, que o enche com a energia satânica insufladora da paixão pela técnica e pelo progresso.

O Fausto histórico

Johannes Georg Faust, o homem, nasceu no ano de 1480 em Knittlingen, na região de Württemberg, Alemanha. Segundo o teólogo protestante Philipp Melanchthon (1497-1560), quase contemporâneo seu e que ele tratou não muito amigavelmente em Wittenberg, entre 1525 e 1532, Fausto teria estudado em Cracóvia, onde a magia era então matéria curricular. Consta que ele fez uma conferência em Worms, em 1539, e que "muitas pessoas se deixaram iludir". Também é fato que muitas famílias de destaque o acolhiam e algumas lhe confiavam a educação dos filhos. Quando ele morreu em 1540, em Staufen im Breisgau, não faltou quem jurasse ter sido por obra do diabo, que lhe viera esganar. O próprio Melanchton admitiu a hipótese de tratar-se de morte sobrenatural.

O Fausto apócrifo

Em 1507 foi nomeado mestre-escola em Kreuznach "um homem muito douto e místico", chamado Georgius Sabellicus Faust Junior, que, conforme uma carta achada na abadia de Sponheim, "abusou dos alunos e fugiu". Em 15 de janeiro de 1509 colou grau de bacharel em teologia, na universidade de Heidelberg, um certo Johannes Faust. Conrad Mutianus Rufus, da paróquia de St. Marien em Gota, conta que um tal Georg Faust blasfemava soberbamente em Erfurt, em setembro de 1513. O bispo de Bamberg declarou ter pago a um Faust, em 10 de fevereiro de 1520, dez moedas de ouro, para que ele lhe lesse o horóscopo. Documentos rezam que um doutor Georg Faust foi banido de Ingolstadt, em 15 de junho de 1528, como charlatão. Um doutor Faust teve negado salvo-conduto, em Nuremberg, a 10 de maio de 1532. Em Münster o doutor Faust, em 25 de junho de 1535, predisse a capitulação da cidade pelo bispo, como depois aconteceu. Em pouco tempo outros mitos e lendas que envolviam personagens como Simão Mago, Cipriano e Teófilo, episódios bíblicos e medievais, burlas e fábulas começaram a compor uma tão considerável tradição oral e apócrifa acerca desse Fausto, que ele acabou por tornar-se figura literária.

O Fausto literário

No intuito de compilar tudo quanto se acreditava e dizia acerca de Fausto, Johann Spiess, livreiro e escritor de Frankfurt, compôs no ano de 1587 a primeira narrativa literária dessa personagem. Era um volume de 227 páginas, intitulado como a Historia von dr. Johann Fausten, cujo enredo contava como ele se vendeu ao diabo a prazo estipulado, as extraordinárias aventuras que viveu nesse ínterim, a magia que praticava, e por fim sua morte e danação. Tudo isso publicado para servir de advertência sincera contra os que levavam a curiosidade intelectual além do limite estabelecido pelas igrejas. Muitos críticos e estudiosos avaliam esse primeiro romance faustiano, ou Faustbuch, como mera propaganda luterana para doutrinação e proselitismo. Controvérsias à parte, outros escritores perceberam que a personagem poderia servir a temas mais profundos e complexos. Com efeito, Fausto tornou-se figura recorrente ao longo de cinco séculos de literatura ocidental. Dois anos depois da publicação de Spiess, ou seja em 1589, o escritor e dramaturgo inglês Christopher Marlowe (1563-1593) transforma Fausto em peça teatral, onde sutilmente retrata o dilema do novo homem ocidental, então dividido entre a religiosidade medieval e o humanismo renascentista. Quase dois séculos depois, no ano de 1760, foi a vez do escritor alemão Gotthold Ephraim Lessing (1729-1781) criar uma nova versão dramática do Fausto, na qual ele encarnaria o heroísmo do intelecto humano, capaz por si mesmo de triunfar sobre o mal, personificado no diabo. A obra de Lessing, porém, hoje encontra-se fragmentada. Não obstante, Fausto se tornaria um das persongens preferidas do período romântico, que vai de meados do século XVIII ao século XIX, a notória época do Sturm und Drang. A personagem apareceria em muitas obras do romantismo alemão como o Fausts Leben (A Vida de Fausto, 1778), escrita por Maler Müller, e o Fausts Leben, Taten und Höllenfahrt (Vida, feitos e danação de Fausto, 1791) escrita por F. M. Klinger. Além destes, Nikolaus Lenau também fez uma versão romântica do Faust. Mas seria através do poeta Johann Wolfgang von Goethe que Fausto alcançaria a sua máxima expressão. A tragédia de Fausto, como dito anteriormente, foi a obra de toda a vida de Goethe. A primeira versão foi composta em 1775, mas era apenas um esboço intitulado Urfaust (Proto-Fausto, ou Fausto zero) que só foi publicado mais de cem anos depois, em 1887, quando o autor já havia morrido. Doze anos após a composição do Urfaust, houve ainda outro esborço, feito em 1791, que era intitulado Faust, ein Fragment (Fausto, um fragmento), e também não chegou a ser publicado. A versão definitiva, só seria escrita e publicada por Goethe no ano de 1808, sob o título de Faust, eine Tragödie (Fausto, uma tragédia), e assim trazia à lume sua maior obra prima. Mas a problemática humana do Fausto continuou a intrigar o poeta, e em 1826 ele começou a escrever a segunda parte do poema, publicado postumamente sob o título de Faust. Der Tragödie zweiter Teil in fünf Akten (Fausto. Segunda parte da tragédia, em cinco atos).

Enredo

No afã de superar os conhecimentos de sua época, evoca Fausto espíritos e, por fim, Mefistófeles, o demônio (palavra que significaria, etimologicamente, inimigo da luz) - com o qual negocia viver por vinte e quatro anos sem envelhecer.
Durante este tempo, conforme o contrato assinado com seu próprio sangue, serviria o diabo a Fausto, em troca da sua alma. Entregue aos prazeres durante este tempo, é finalmente ao termo deles levado para o Inferno.
Tendo, porém, encontrado o amor de Margarida, dela tenta obter a salvação, mas foi inevitável o destino a que se comprometera.

O Fausto pós-moderno

Sendo um arquétipo da alma humana, o mito de Fausto jamais se esgotou simbólica e literariamente, de modo que diversos artistas contemporâneos e posteriores a Goethe reagiram criativamente à personagem.
O poeta russo Puchkin escreveu em 1826 um Faust notável pelo diálogo com Mefistófeles. Christian Dietrich Grabbe também compôs em 1836 uma tragédia onde confrontava Don Juan und Faust(Don Juan e Fausto). No século XX, o poeta francês Paul Valéry escreveu a peça Mon Faust (Meu Fausto), sem todavia a concluir.
Depois foi a vez do magnífico poeta português Fernando Pessoa escrever Fausto: Uma Tragédia Subjectiva, inusitadamente narrado na primeira pessoa. E por fim, Thomas Mann publicou seu grande romance Doktor Faustus em 1947.
Recentemente, em 2008, o escritor Rafael Dionísio lançou os seus "Cadernos de Fausto" revisitando também este mito. Fausto também foi tema para as peças musicais de vários compositores clássicos como Wagner (Faust), Berlioz (La Damnation de Faust), Schumann (Szenen aus Goethes Faust),Liszt (Faust-Symphonie) e Gounod (Faust).

Veja também: Fausto, de Goethe - Um Exercício Interpretativo 
                      Essência e Aparência no Fausto de Goethe:Uma Relação Dialética

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