Fazendo as Malas – Danuza Leão

Mais que um guia , o livro é uma agradável viagem aos relatos de Danuza sobre con­su­mo, valores e culinária.

Fazendo as Malas"Afinal, o que é uma mulher sem malas?"

Essa é a pergunta que faz Danuza Leão ao se preparar para uma viagem curta à Europa. Tudo começa numa de suas constantes insônias, que ela tenta inutilmente driblar lendo, escrevendo, vendo televisão, ou mesmo trocando de lugar os móveis da sala. Ou, ainda, deixando a imaginação viajar. Pois foi da combinação entre um filme na televisão - com Ava Gardner, Tyrone Power, Errol Flynn e muitas touradas e flamencos - e suas divagações que lhe veio a idéia: por que não voltar à caliente Sevilha na época da animadíssima Feria?

Daí para uma viagem que incluísse, além da capital da Andaluzia, Lisboa, Paris e Roma foram apenas alguns telefonemas para empresas aéreas e hotéis. Tudo muito fácil. Exceto por um pequeno problema: seria preciso fazer a mala, ou melhor, as malas. Como diz Danuza, ela costuma levar, segundo os seus critérios, o mínimo possível. Só que - ela confessa também - seus critérios "são sempre exagerados". E assim, graças a uma insônia - e carregando três malas grandes, todas cheias -, ela partiu para a breve e deliciosa viagem que relata neste livro repleto de dicas espertas e saborosas sobre hotéis, restaurantes, passeios e as obrigatórias compras. (Depois de uma jornada nas Galeries Lafayette e no Printemps de Paris, a autora joga a toalha: "Resultado do dia: uma mulher destruída, arrasada, querendo só uma coisa na vida: sossego, e nunca mais ouvir falar de compras. E vendendo a alma ao diabo para arranjar um táxi".)

A alegria colorida das festas sevilhanas, as tentações irresistíveis dos doces portugueses, os preços estratosféricos (e a qualidade nem tanto) das maisons e butiques parisienses, e a elegância e o romantismo dos homens romanos são alguns temas desta viagem conduzida pelas mãos sábias de Danuza Leão.

E, com sua ironia graciosa, ela encerra com chave de ouro: "Com todas as agruras que é viajar hoje em dia - as filas no check-in, as revistas para ver se você não é terrorista, as malas que são desfeitas e refeitas -, viajar ainda é das melhores coisas do mundo, e é bom aproveitar agora, já, porque os chineses estão chegando...".

No final do livro, o leitor encontra um roteiro com informações úteis sobre os hotéis, restaurantes, bares e lojas citados por Danuza.


REPORTAGEM NA FOLHA DE S. PAULO - 23/11/2008

Em livro com relatos de viagem, Danuza Leão reflete sobre a elegância feminina

PLÍNIO FRAGA
da Folha de S.Paulo, no Rio

Ter dinheiro sem ter boa cabeça é o caminho mais curto para a deselegância. O que está muito na moda está fora de moda. Criticar evita o infarto. A alta-costura não existe mais. Uma mulher requintada é discreta, magra e não usa salto alto. No máximo um saltinho.

Ouvir frases como essas --na contramão da obviedade e na esquina da maledicência bem-humorada-- eram privilégios dos poucos amigos que Danuza Leão cultua, ainda mais se entrecortadas pela delícia de estar numa bodega em Sevilha, num bistrô em Paris ou numa tratoria em Roma.

O novo livro da colunista da Folha Danuza Leão, "Fazendo as Malas", pode parecer uma simples reunião de dicas de turismo. É possível embarcar nesse roteiro prosaico com bastante deleite, acompanhando-a por quatro cidades européias.

Mas os relatos de Danuza permitem uma viagem mais profunda, numa análise de como o consumo das idéias, valores e produtos_ar pelos anônimos se transforma em história. Ou, ao menos, em boas histórias.

Danuza começa afirmando que suas malas de viagens são proporcionais aos seus critérios. "Devo confessar que meus critérios são sempre exagerados", diz, logo nas primeiras páginas. Mas os critérios dela são argutos e estão longe do politicamente correto. Leves como não podem ser suas malas.

O livro foi escrito a partir de uma viagem a Sevilha que Danuza tinha programado para março deste ano. Após uma conversa com o editor Luiz Schwarcz, que já havia publicado sua autobiografia, "Quase Tudo" (mais de 170 mil exemplares vendidos), ela esticou até Lisboa, Paris e Roma. De posse de um bloquinho, anotou quase tudo o que comeu, bebeu, conversou e viveu.

Ao voltar ao Brasil, debruçou-se para concluir uma obra que mescla programas de viagens e uma penca de observações e confissões saborosas. "Já fui bem consumista, mas melhorei muito, até porque o que vejo não me dá mais a taquicardia que dava quando, por exemplo, eu deparava com um vestido deslumbrante", assume ela.

Combate chavões ao citar que, em qualquer lugar do mundo, pede-se um copo de vinho ou champanha --"un verre de vin", "a glass of wine". "Só no Brasil existe o hábito de pedir uma taça de vinho, ou uma tacinha, pior ainda."

Ao relatar um passeio com uma amiga, justifica a ida ao café mais próximo para "criticar os horrores" das vitrines, exercício que afirma evitar a possibilidade de ataques do coração.

Comemora o fracasso alheio, em nome do bom gosto: "Aquele restaurante de Nova York e Los Angeles, o Nobu, pretensioso até mais não poder, abriu em Paris e fechou, por não ter feito nenhum sucesso. Deus existe e, às vezes, é justo. A-do-rei". Não perdoa a celebrização dos chefs. "Tenho o péssimo hábito de gostar de ser muito bem recebida onde quer que eu vá, e a vaidade dos novos chefs me deixa petrificada. Por quem se tomam eles? Por Deus?"

Ao se deparar num restaurante italiano com Lee Radziwill, a irmã de Jacqueline Onassis, destila a arte feminina de medir com os olhos. "Claro que olhei muito para ela (disfarçadamente), e refleti sobre o que faz uma mulher ser elegante. Elas se vestem sempre de maneira bastante discreta, e é raro usarem cores fortes."

Matemática Chanel

Danuza diz que mulheres elegantes devem estar atentas a uma lei matemática de madame Chanel: se a mulher é pequena, não deve usar salto alto; simples questão de proporção.

Ex-modelo nos anos 50, Danuza desdenha do mundinho fashion. "A moda mudou. Adeus à alta-costura, adeus aos vestidos que embelezam as mulheres. O que existe hoje deveria ter outro nome, diferente de "moda", pois essa terminou quando Givenchy, Valentino, Saint Laurent saíram do palco. Agora é outra coisa, em algumas ocasiões até divertida."

No livro, a ex-fumante Danuza expõe outros vícios: "Como toda mulher que se preza, sou louca por sapatos e botas". Em Paris, neste ano, viu-se próximo de quebrar suas regras ao "quase desmaiar" quando se deparou com uma linda sandália salto 12. Teve de comprá-la.

"Quando voltei ao Rio, vi que jamais usaria a sandália, até porque, como perdi o hábito, não sei mais me equilibrar em cima de saltos. Mas rapidamente soube o que fazer: ela foi para a estante, onde posso vê-la o tempo todo (e lembrar das minhas loucuras)."

De perto ninguém é normal nem santo, prova Danuza ao narrar incidente em Roma. "Ia atravessando a rua --o sinal estava verde para mim e eu acreditei-- quando veio um carro, passou o sinal vermelho e quase me atropelou. Sabe quem estava ao volante? Um padre. Será que isso não é pecado?"

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