Ideais de Thomas Hobbes

Hobbes descreve a compreensão dos processos e mecanismos que movem o ser humano em sociedade, através de uma perspectiva extremamente realista e profunda, desvendando a maquiagem encobridora da visão cristã, predominante na época.

Thomas_Hobbes_leviathanPor Rubem Queiroz Cobra
Doutor em Geologia e bacharel em Filosofia

Hobbes é empirista e racionalista; põe em prática o empirismo nas suas observações e conclusões sobre a natureza humana, mas faz uma análise das palavras e do raciocínio que é dedutiva, racionalista, principalmente em ciência política.
Contestando Descartes, pergunta: de onde viria o conhecimento da proposição "eu penso"? Como não podemos conceber qualquer ato sem seu sujeito, assim também não podemos conceber o pensamento sem uma coisa que pense... Donde se segue "que uma coisa que pensa é alguma coisa de corporal"
Descartes respondeu-lhe que existem "atos que chamamos corporais, como a grandeza, a figura, o movimento"; esses atos "residem" em corpos. Porém, diz Descartes, há outros atos que chamamos intelectuais como o "querer, imaginar, etc... esses atos "residem" em uma coisa que pensa, tenha ou não esta coisa o nome de espírito, pouco importa, "conquanto não a confundamos com a substância corporal, uma vez que os atos intelectuais não tem qualquer afinidade com os atos corporais". Em suma, o pensamento difere totalmente da extensão"

Conatus

Na sua concepção de natureza humana é básico o conceito de conatus, a força genética do comportamento. É um impulso original ou "começo interno" do movimento animal para se aproximar do que lhe causa satisfação ou para fugir do que lhe desagrada. Esse conatus impulsiona o homem a vencer sempre. A vida começa com o conatus positivo, o desejo. Em termos de vida social, ultrapassar o outro é fonte primordial de satisfação, por isso estar continuamente ultrapassado é miséria enquanto ultrapassar continuamente quem está adiante é felicidade. É da sua natureza o egoísmo, constituído por "um perpétuo e irrequieto desejo de poder e mais poder que só termina com a morte" .
O conatus provoca "guerra de todos contra todos", é o estado natural em que vivem os homens, antes de seu ingresso no estado social. O homem é governado por suas paixões e tem como direito seu conquistar o que lhe apetecer. Como todos os homens seriam dotados de força igual (pois o fisicamente mais fraco pode matar o fisicamente mais forte, lançando mão deste ou daquele recurso), e como as aptidões intelectuais também se igualam, o recurso à violência se generaliza .

Instinto de conservação

Mas, além do conatus, governa o homem também o instinto de conservação e este leva ao desejo da paz. Deixado meramente a si mesmo, o instinto de conservação é abertura para a vio lência enquanto esta não é um risco, e, ao mesmo tempo, para a paz tática que prometa conservação. Assim se define o campo da lei natural de sobrevivência.
Por isso o instinto de conservação é peça tão fundamental na filosofia de Hobbes quanto sua idéia do conatus, porque para ele, ao contrário do pensamento aristotélico que tem o homem como um animal social, os indivíduos entram em sociedade só quando a preservação da vida está ameaçada. E estaria ameaçada pelos próprios indivíduos, se cada qual tudo fizesse para exercer seu poder sobre todas as coisas. A paz é a dimensão mais compatível com o instinto de conservação.

Contrato de segurança interna e externa

Pode-se então supor algo como um contrato tácito entre os homens, implicando em que contêm os seus ânimos, como defesa interna, e que, reunidos, formarão um povo, de modo a que a multidão dos associados seja tão grande que possa garantir a defesa externa, tirando a esperança de seus adversários de que um pequeno número baste para assegurar-lhes a vitória.

Ética

A vontade obedece à razão, segundo o racionalismo clássico. Porém, para Hobbes, é apenas apetite. Um determinismo mecanicista regeria não só os movimentos do universo como também a atividade psicológica do homem. O livre arbítrio não passaria de ilusão: seria apenas uma ex pressão destinada a ocultar a ingnorância das verdadeiras causas das decisões humanas. Porém, qualquer que seja seu fundamento, a contenção interna implica uma ética. No nível das relações morais, é preciso que cada um - segundo Hobbes - "não faça aos outros o que não gostaria que fizessem a si"; é preciso evitar a in gratidão, os insultos, o orgulho, enfim, tudo o que prejudique a concórdia .
As leis não são deduzidas por Hobbes de um instinto natural, nem de um consentimento universal, mas da razão que procura os meios de conservação do homem; elas seriam imutáveis por constituírem conclusões tiradas do raciocínio. Tal postulado faz de Hobbes um pioneiro do Utili tarismo, porque justificava a obediência moral como meio para uma "vida social, pacífica e confortável".

Finalidade do governo

As leis, no entanto, careceriam de um reforço como garantia de seu cumprimento em salvaguarda do pacto social. Torna-se indispensável um governo que fosse seguido por todos os componentes do corpo social, e isto haveria de requerer que esse governo tivesse toda a força, porque somente seria capaz de corresponder à sua finalidade se exercido despoticamente. Levando em conta o desejo de ultrapassar a todos presente em cada um, sempre existiriam pessoas que, acreditando saber mais do que as outras, poderiam desencadear guerras civis a fim de conquistar o poder só para elas.

Absolutismo

Esta é a justificativa para o absolutismo, que Hobbes não deriva o absolutismo de um direito divino, como os teólogos políticos de sua época, mas das exigências do pacto social. Hobbes não admite um governo misto como a monarquia constitucional, acreditando que esta permite competições comprometedoras da paz entre os vários detentores do poder .
O soberano não precisa dar satisfações de sua gestão, sendo responsável apenas perante Deus "sob pena de morte eterna". Não submetido a qualquer lei social, o soberano absoluto é a própria fonte legisladora. A obediência a ele deve ser total, a não ser que ele se torne impotente para assegurar paz durável e prosperidade. A fim de cumprir sua tarefa, o soberano deve concentrar todos os poderes em suas mãos: "Os pactos sem a espada não passam de palavras" .
Hobbes teme a eloqüência, o que hoje se chamaria de demagogia. "É a loucura do vulgo e a eloqüência que concorrem para a subversão dos Estados", diz Hobbes. Por isso ele prefere um rei, assessorado por um conselho secreto de homens escolhidos.

Religião do Estado

Ao soberano absoluto deve pertencer, também, segundo Hobbes - todo poder de decisão em matéria religiosa. "Não há quase nenhum dogma referente ao serviço de Deus ou às ciências humanas de onde não nasçam divergências que se continuam em querelas, ultrajes e, pouco a pouco, não originem guerras; o que não sucede por falsidade dos dogmas, mas porque a natureza dos homens é tal que, vangloriando-se de seu suposto saber, querem que todos os demais julguem o mesmo". Hobbes não vê solução para esses conflitos a não ser pela entrega de toda autoridade religiosa ao soberano absoluto; caso contrário a religião ameaçaria a paz civil.
O Estado deve instituir um culto único e obrigatório: "porque, caso contrário, seriam encontradas em uma mesma cidade as mais absurdas opiniões referentes à natureza divina e as mais impertinentes e ridículas cerimônias jamais vistas".

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